segunda-feira, julho 09, 2007

CABELO DE PRETO



Adeus Black Power? Semana passada eu estive pensando em cortar o meu cabelo, por isso escrevi este texto que, durante a produção, me causou surpresas... Pois bem, duro, pixaim, ruim, fuá e bombril são alguns dos adjetivos e sinônimos usados para qualificar o cabelo crespo dos negros na linguagem popular. O imaginário associado aos nossos cabelos é extremamente negativo, ligado à feiúra, ao mau gosto e à anormalidade. Durante anos, a atitude dos pretos ao redor do mundo em relação ao problema do cabelo tem sido a busca de intervenções químicas que o trouxessem para mais próximo do tipo de cabelo "padrão", associado ao belo e ao bom gosto: o liso. Dentro desse universo, o corpo negro é concebido em um misto de repulsa e desejo. Se, por um lado, partes como a boca, o nariz, o cabelo e a pele são vistos como aberrações e tendem a serem rejeitados, levando a uma baixa auto-estima, por outro, o combate a essas construções é realizado através de uma valorização da sexualidade, algo elaborado a partir de imagens de homens e mulheres negros superdotados sexualmente. Em meio a essa esquizofrenia, temos debatido há muito tempo. Minha intenção aqui é discorrer sobre uma parte dela: o chamado cabelo problema. Existiria uma supremacia do cabelo liso entre as mulheres em geral e as negras em particular? Creio que sim. Diante dessa resposta afirmativa, tenho ciência de estar abrindo para uma série de críticas vindas de mulheres negras. Dirão que o fato de usarem o cabelo desta ou daquela maneira ou de realizar tratamento químico no couro cabeludo é algo peculiar a qualquer mulher, independente de ser negra, branca ou asiática. Respeitando a liberdade das mulheres de fazerem o que bem entenderem com seu cabelo, penso que as intervenções são realizadas tendo um padrão: o de beleza branco ou, para utilizar aqui um eufemismo, o dominante. É bom que fique claro (ou escuro rs) desde já que este fato não se restringe às mulheres. A moda tão popular tempos atrás entre artistas e atletas negros homens de raspar o cabelo também pode ser encarado como uma resposta ao "cabelo problema", apesar das argumentações em favor desse estilo como mais higiênico e prático. Seria então o cabelo crespo sujo e difícil de cuidar? O problema não está na diferença, mas no que certas marcas passam a designar. O cabelo crespo, para todos, seja negro ou branco, homem ou mulher, é, na maioria das vezes, visto como sujo, feio e difícil de lidar. Já há algum tempo notei, em minhas buscas nos comércios por um xampu e condicionador para meu cabelo, que não há produtos específicos para cabelos crespos, mas só para os "quimicamente tratados".

Nos rótulos desses produtos é possível observar, na maioria das vezes, a imagem de uma mulher preta extremamente atraente com os cabelos encaracolados (depois de quimicamente "tratados", acho!). Aliás, é bom lembrar que esse é o país no qual as técnicas de intervenção química no cabelo crespo se tornaram mais avançadas. Na década de 1960, a Fuller Produces Company faturava em torno de 10 milhões de dólares com a venda de cremes para branquear a pele e alisar o cabelo, o que, em uma visão extremamente ingênua (ou oportunista!) da empresa, acabaria com a discriminação. Em retaliação, ativistas do movimento Black Power deixaram crescer os cabelos, usando os mesmos sem a intervenção de produtos químicos. Estava criado o "afro" ou o visual black power, que tanto sucesso fez entre jovens negros e não-negros entre os anos 1960 e 1970. Na mesma época, Martir Luther king, estava no apogeu. Entre os negros, era comum utilizar o cabelo black power, não era um simples modismo, era a maneira encontrada para mostrar a raça e a união dos negros em todo o planeta. Era a época dos Panteras Negras, que até viraram motivo de protesto nas Olimpíadas da Cidade do México em 1968, a equipe de revezamento dos EUA, subiu ao pódio e comemorou o ouro com os punhos cerrados, não houve nada de palmas ou abraços. Fui um protesto silencioso em razão da situação dos negros americanos que estavam lutando no Vietnã. No começo dos anos setenta, o movimento negro no mundo apresentou crescimento, talvez tenha sido nesta década que o mundo conheceu o verdadeiro sentido da palavra consciência negra. Resumindo, uma re-elaboração da estética negra traz vários outros estilos de cabelo como opções às tão cruéis intervenções químicas. Teremos liberdade para usar o cabelo da maneira que bem entendermos se tomarmos ciência de que nosso cabelo não é ruim, muito menos feio, mas um cabelo como qualquer outro que exige cuidados e possui uma beleza singular. Nessa nova estética dos nossos cabelos há lugar para os dreadlocks, as tranças dos mais diversos tipos e o black power, para ficar apenas nos mais conhecidos. A única coisa a ser feita é usar a criatividade. Ter cabelo crespo não é um problema. Danem-se os imbecis que perguntam "qual é o pente que a penteia" ou "que cabelo dela não nega", pois o meu também não nega e nem "avoa". Beijo a todos que tem na cabeça algo além de cabelo.

1 Comments:

Blogger Unknown said...

Motumba e parabens! adorei sua colocacao de orgulho negro.

18 abril, 2009 08:08  

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